sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Hitchock e os pássaros do avião

Houve uma época em que Hitchcock assustou o escurinho do cinema com seus pássaros assassinos. O filme é tão bom que blogueiros de 15 anos dedicam linhas e mais linhas ao tema. Acho sensacional.
Mas e os pássaros de todos os dias, esses que entram na turbina dos aviões e provocam grandes e pequenos desastres?
Ontem, depois de várias horas longe do computador, voltei pra casa e liguei a TV. Não acreditei nas imagens do avião afundando no rio Hudson, em Nova York. Alguns segundos de perplexidade para entender que todos os passageiros tinham sido resgatados e sobrevivido. Que sensação boa! Tentei imaginar o que passou pela cabeça e pelo coração de toda aquela gente nos segundos que antecederam a aterrissagem na água. O medo e depois o alívio. A volta ao planeta de todos os dias. A felicidade de estar simplesmente vivo mas radicalmente modificado. Passar raspando pela morte e sobreviver ao imponderável.

Em épocas de massacres em Gaza faz bem saber que o talento e a experiência de um piloto e sua equipe venceram os pobres pássaros de Nova York. Que filme faria, com um belo argumento desses, o nosso mestre do terror?
Viva a vida e quem ajuda a viver.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

A empáfia de alguns guardas municipais



O rapaz, morador de rua, dorme no calçadão da Praça do Lido, em pleno verão carioca. Três guardas municipais acordam o rapaz, dois o seguram e o outro lhe pespega tapas na cara e pontapés no corpo. Declaram a prisão do infeliz.
Mas...........antes que tudo seja concluído como sempre é - nós, pedestres, olhamos com indignação mas não podemos estapear esses mesmos guardas - um outro rapaz, provavelmente um advogado vestindo inacreditáveis terno e gravata às 3 horas da tarde, começa a discutir com o chefe dos guardas. Morador do Lido, diz que o sem teto não pode ser tratado a bofetões e nem ser preso da forma que foi. Que a agressão é gratuita, irregular e sem sentido. O guarda discorda, eles falam alto e uma pequena multidão assiste ao suposto confronto. Ali, na calçada da avenida Atlântica, a indignação é geral. Muita gente tinha presenciado a agressão dos guardas. O mendigo coloca a cabeça pra fora do carro e tenta explicar, mais uma vez, que foi agredido assim, de repente, sem mais nem menos. Covardes, alguém grita. O clima é tenso e os policiais, cacetete na mão, olham para nós com cara feia.
O jovem de terno e gravata quer saber para onde o mendigo será levado. Um outro guarda, recém desembarcado de uma outra kombi lotada de guardas municipais, responde que isso não interessa a ninguém. O suposto advogado se irrita e fala mais alto ainda que todos têm o direito de saber para onde o preso será levado. Mais tensão, mais discussão, dedos em riste. E o guarda municipal declara a prisão do moço de terno e gravata. Ele é empurrado para dentro de uma outra kombi, enquanto a platéia vaia e atira frases exigindo explicações. Todo mundo conversa com todo mundo, mas o guarda-chefe cisma com o papo de um outro engravatado, que diz algo como "esses caras são recalcados porque não passaram no teste pra PM". Humor on the road.

Pasma com a empáfia desses servidores municipais me pergunto até quando a pobreza de espírito reinará entre os fracos e oprimidos. Será que alguém pode organizar um curso de " Humanidades" pra que essa turma aprenda como tratar as pessoas? Ou nem isso vai adiantar, já que bons modos não está escrito no glossário utilizado por eles?
Antes de escrever fui tentar saber se a Guarda Municipal tem poder de polícia. Li e reli, mas confesso que não entendi. Parece que podem prender alguém em flagrante, como qualquer cidadão também pode. Para onde levaram o rapaz de terno e gravata? Torço para que ele seja um advogado, um promotor de justiça. E que enquadre a arrogância e a violência dos guardas municipais. Mas se ele for simplesmente um cidadão indignado, já conta com a minha admiração porque resolveu mudar o seu trajeto de todos os dias para protestar contra o abuso do poder. E acabou sendo preso.
É como observou um outro rapaz: " esse morador de rua até pode ser um assaltante, mas ninguém tem o direito de abordá-lo a tapas e pontapés enquanto ele está dormindo" . A guarda municipal não reagiu, não preveniu. A guarda municipal agrediu o cidadão mais vulnerável da cruel escala social em que vivemos. Já imaginou esse pessoal armado?

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Globo de Ouro




Não assisti à transmissão do Globo de Ouro. Mas gostaria de ter visto Mickey Rourke receber o prêmio de melhor ator, homenagear seus cães e agradece-los pela companhia e "amizade". Não vi "The Wrestler" mas o treiler me impressiona. Que mistérios e labirintos separam o Mickey galã de " O Selvagem da Motocicleta" ou " 9 e 1/2 Semanas de Amor" do Rourke de rosto amassado e costurado em filmes como "Sin City" e esse último, que já lhe rendeu um Urso de Prata em Berlim? Quantas carreiras, quantas doses, quantos socos, quantos sonhos? Como alguém destrói um rosto que exalava sensualidade e o transforma num esconderijo de dor e autodestruição?
Não conheço as respostas. Mas consigo imaginar o que a fama e o dinheiro podem fazer com os corações e mentes mais vulneráveis.E cada vez que me deparo com a imagem atual de Mickey Rourke fico tentando descobrir uma expressão, um gesto, um traço........da harmonia anterior ao desastre. Em vão. Não procuro nesses esgares o jovem galã. Busco algo da forma original. Sempre em vão.
Gostei da premiação e da volta por cima - um processo reiniciado já há algum tempo - do ator que fez suspirar toda uma geração de jovens e coroas. Homens e mulheres. Mas, interessante mesmo foi o cara dizer, no microfone, que " às vezes, quando um homem está sozinho, tudo que lhe sobra é seu cachorro". Pra quem já foi conhecido e criticado pela empáfia típica das celebridades, Mickey deu um baita passo a frente ao agradecer, em público, a divina paciência dos cães. Não deve ter sido fácil.

Outra premiação interessante foi a de melhor ator em série dramática para Gabriel Byrne. A série " Em terapia", da HBO, trouxe Byrne em grande forma. Mostrou também grandes performances de atores que vemos por aí, sem prestar muita atenção. E fez vingar no horário nobre da tv paga diálogos primorosos. Parabéns ao original israelense. E que venha rapidamente mais uma temporada.

domingo, 11 de janeiro de 2009

No, we can´t !


Aproxima-se a posse de Obama. Fuzuê total em Washington. A turma do "Yes, we can" prepara-se para assumir o poder. Nós, aqui dos trópicos, podemos aproveitar esse período de suposta euforia para refletir sobre o " No, we can´t".
Em 2009 não podemos tolerar a hipocrisia, a indiferença e a corrupção. No governo e na população. Em nós mesmos. Vamos aproveitar um ano sem eleições para pensar muito. Assim como quem não quer nada... não custa prestar atenção no que podemos fazer para começar a eliminar essas três palavrinhas diabólicas do nosso dia-a-dia.

Hoje, domingão, numa caminhada aqui pela praia fui testemunha de um lindo espetáculo ao ar livre. Um senhor de mais de 80 anos se apresentava, como faz toda a semana, ali na Pedra do Leme. Sapateou como Fred Astaire, dançou como Michael Jackson e fez soar suas castanholas com esquetes de muita criatividade e humor. A platéia, que no início fingia indiferença e soltava algumas risadinhas de desdém, foi seduzida lentamente pelo artista. Quando passou o boné para as contribuições o clima era outro. Com talento e humor o velhinho arrancou elogios, abraços, aplausos e uma grana acima da média para aparições circenses do gênero. Mas o melhor de tudo foi ver derreter-se em alguns rostos, ainda que por pouco tempo, a máscara da indiferença e da hipocrisia. Venceu o afeto durante alguns minutos deste 11 de janeiro de 2009. Yes, we can!


sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Travei........


As atrocidades cometidas em nome da autodefesa, na Faixa de Gaza, não param de chegar até nós. Motorista da ONU assassinado, trinta civis palestinos mortos num abrigo, fim da ajuda humanitária.... Juro que travei. E ainda por cima, aqui na faixa tupiniquim do Rio de Janeiro, os tiros não esperaram passar a primeira semana de 2009. Os morros da Babilônia e Chapéu Mangueira foram sacudidos por várias saraivadas. Nós, do asfalto, ficamos torcendo para que nada de muito ruim aconteça por lá. O pior são as centenas de trabalhadores que voltam para suas casas, no cair da noite, e são recebidos por esse ambiente de terror que já virou rotina nos morros da cidade.

Por conta dessas guerras adotei o silêncio nos últimos dois dias. E estou muito curiosa pra saber o que fará Obama a partir do dia 20 de janeiro. E a cada dia que passa apenas confirmo: esses israelenses da guerra são de uma cara de pau, de uma arrogância, de uma empáfia e de uma crueldade sem limites. Por coincidência leio, ao mesmo tempo, dois livros sobre o tema: AS BENEVOLENTES, de Jonathan Littel - as memórias nuas e cruas de um ex- oficial nazista - e UMA VONTADE LOUCA DE DANÇAR, de Élie Wiesel, prêmio Nobel da Paz e Fundador Chefe do Conselho Norte-Americano da Memória do Holocausto.

Os dois livros têm a ver com o trabalho individual de cada um para lidar com as perdas, com as culpas e com um vazio imenso que ocupa quase todo o coração.
E o governo de Israel, como lidará com as perdas e danos no futuro próximo?
E a quantidade imensa de crianças palestinas mortas - até hoje 257 - durante esses ataques?
E o ódio, que só faz se alastrar?
Por isso tudo fiquei quietinha.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

ONU, CASA DA MÃE JOANA


Que a violência tenha virado arroz-com-feijão em terras cariocas já é clichê. O Rio de Janeiro convive com bandidos - os legalizados e os chamados ilícitos - há bastante tempo. Bandidos da pior espécie. Testemunhamos crimes hediondos, aplaudimos filmes que retratam a barbárie e sonhamos com um final feliz para o ocupação do Dona Marta. Mas ainda não fomos para as ruas, em massa, denunciar a corrupção e exigir o fim da bandidagem que nos cerca.
Mas isso é Rio de Janeiro, RJ, Brasil. É São Paulo, Recife, Vitória, Fortaleza e Belo Horizonte, pra citar apenas algumas de nossas capitais. Em áreas tupiniquins, as festas de final de ano só não mataram mais gente, nas estradas, do que os ataques israelenses na faixa de Gaza. E estamos em época de lei seca, hein?

Um minuto de silêncio. O nosso trânsito nacional é uma tragédia a lamentar que mata milhares de jovens. Gente que não vive até os 30 anos de idade. Quando faremos alguma coisa para mudar esse cenário?
Agora que já fizemos uma rápida e rasteira resenha dos nossos primeiros dias de 2009 volto ao tema Faixa de Gaza. Então deixa eu entender melhor: os israelenses atacam duas escolas da ONU em Gaza, matam 40 civis só nesta terça e............necas de pitibiribas? A ONU fica lá, bonitinha, esperando as próximas instruções do governo Bush? Obama está preocupado? Oh, dear!
Parte do mundo se revolta, ainda bem, mas não o suficiente pra fazer com que esses megalôs interrompam a carnificina.
A bandidagem aprende rápido, né mesmo? Com exemplo da ONU fica difícil exigir algum choque de ordem.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Invasão de Gaza: a culpa de todos nós


Até quando vamos ter que assistir aos ataques em massa de Israel à faixa de Gaza? O fato do Hamas lançar foguetes no sul de Israel justifica a retaliação desproporcional, que já matou mais de 400 palestinos?

Faz muito tempo que o Holocausto não serve mais como justificativa - pelo menos para mim - para todos os crimes cometidos pelo governo israelense em nome da ameaça palestina. E hoje, ao ler o artigo do jornalista inglês John McCarthy, no Globo, essa certeza ficou ainda mais cristalina. McCarthy, para quem não sabe, foi o jornalista sequestrado pela Jihad Islâmica no Líbano, em 1986. Ficou cinco anos em poder dessa turma da pesada. Quando foi libertado, seu sofrimento foi relatado em filmes e livros.
Tudo isso pra contar pra vocês, que não leram o Globo, que McCarthy escreveu o seguinte sobre o ataque de Israel: " ....Embora a resposta desproporcional já tenha provocado diversos pedidos de moderação por parte de vários organismos internacionais, o governo israelense continua a se retratar como uma vítima passiva sob ameaça. Ehud Barak (ministro da Defesa) descreveu Israel como "uma vila no meio da selva" e um local civilizado cercado de hordas de selvagens"".
Preconceito, discriminação, racismo? Já vimos esse filme.
Gaza se encontra mesmo à beira de um desastre humanitário, como relata McCarthy. Sem luz, sem água, sem remédios, sem combustível e sem alimentos. Mas Israel ignora inúmeras resoluções da ONU, sempre com o apoio dos Estados Unidos.
A pergunta-chave, no artigo do jornalista britânico, é a seguinte: por que não há uma pressão real para que as resoluções da ONU sejam cumpridas por Israel? Na opinião dele, em parte porque nosso imaginário coletivo carrega a culpa pelo Holocausto. Criticamos as posições de Israel mas não temos coragem de ir muito além disso, talvez por medo de sermos acusados de atacar um povo que já sofreu tanto em sua longa história. "A tragédia", conclui Mc Carthy, " é que, agora, um outro povo está sofrendo por causa da hesitação do mundo em ofender Israel.
Cabe à imprensa internacional, em sua maioria pró-Israel, desempenhar de verdade o seu papel fiscalizador e cobrar de Israel - e dos Estados Unidos - o fim do bloqueio e dos ataques desproporcionais que matam com bombas, de fome e de sede centenas de civis, entre eles inúmeras crianças.
A culpa pelo Holocausto é de todos nós. Mas assistindo a essa guerra infinita, no Oriente Médio, e às posições de Israel, tenho me perguntado muitas vezes se o Holocausto foi mesmo o limite da crueldade humana na chamada era moderna.