sábado, 28 de novembro de 2015

CHICO - UM ARTISTA BRASILEIRO

Parem as máquinas, suspendam as contra-indicações e encarem a real: assistir ao filme de Miguel Faria Jr é, antes de tudo, entregar-se à fruição do prazer. E nada atrapalha essa curtição. Dá pra tietar sim, sem culpa ou cobranças por algo mais polêmico ou inquiridor. 

Nãnaninãnã! O objetivo do diretor não era encostar Chico na parede e faze-lo confessar as causas profundas e inconscientes do final de seu casamento ou de seu afastamento da política partidária. A intenção do diretor, creio, foi deixar o amigo à vontade para discutir temas variados que recheiam uma história de vida intensa e constantemente questionada pelo próprio entrevistado. 


É a montagem de Diana Vasconcellos que transforma o espectador em cúmplice. Estão ali os Chicos que conhecemos, mas também um homem que indaga sobre sua produção no passado e tenta prever, com humor, o que poderá ser o seu futuro como compositor e escritor. 

Além do belo enquadramento do rosto de Chico, by Lauro Escorel, o que arrebata de primeira é o espetáculo musical que afaga todos os sentidos. Nada é óbvio. A escolha das músicas, nem sempre famosas, surpreende e emociona. É como se saíssemos da sala de cinema direto para a casa de shows. E a cada número um aplauso entusiasmado. 

As mulheres de Chico estão nas vozes de Martnália, Mônica Salmaso, Laura Garin, Adriana Calcanhoto e no tom cristalino de Clara, a neta de Chico. Mas, pausa para a emoção: o que é Carminho, a sensacional cantora portuguesa, interpretando "Sabiá"? Êxtase puro. 

E o que dizer das apresentações de Ney Matogrosso e Milton Nascimento - em dueto sublime com Carminho - e do próprio Chico? Melhor o silêncio, leitor. Assim, a experiência será ainda mais impactante e duradoura. 

Durante os 110 minutos de projeção compartilhamos as memórias, a imaginação, os questionamentos e as ponderações de Chico. Você pode até não concordar com algumas revisões do passado, mas vai gostar de ver, na telona, esse homem de 71 anos que revê sua caminhada com leveza, crítica e compaixão pelo menino que já foi. 

As presenças de Tom Jobim, Vinícius de Moraes, Caetano Veloso, Maria Bethânia e Bibi Ferreira - todos respirando juventude e exalando talento - enriquecem o filme e tornam ainda mais saboroso testemundar a trajetória única de Chico. 

São quase duas horas para viver e relembrar, junto com Chico Buarque de Holanda, o Brasil dos últimos 50 anos. Compre seu ingresso e se acomode na poltrona. É bom demais.

sexta-feira, 27 de novembro de 2015

AWAKE - A VIDA DE YOGANANDA

Alguns filmes têm a virtude de, terminados, provocar no espectador a vontade de saber mais. Aconteceu comigo depois de ver AWAKE - A VIDA DE YOGANANDA. 

Conhecia muito pouco sobre a vida desse iogue e guru que nasceu em 1893, na India, e morreu em 1952, em Los Angeles. E então,depois de assitir ao filme, cheguei em casa e descobri uma frase, do próprio Yogananda, que traduz a sensação que me acompanhou durante toda a projeção:


"A melhor coisa que você pode fazer 
para cultivar a verdadeira sabedoria 
é praticar a consciência 
de que o mundo é um sonho". 

Esse homem que saiu da India para levar sua mensagem à estranha terra do tio Sam, nos anos 20 do século passado, está ali, na tela, em raros fotogramas que o tornam real para o espectador, e na narração marcante do ator Anupam Kher, estrela de Bollywood, que dá voz a Yogananda,sempre na primeira pessoa. 

Sentado no escurinho, você é testemunha de uma viagem espiritual narrada pelo próprio guru, com depoimentos tocantes de muitos de seus discípulos, entre eles o ex-Beatle George Harrison, o músico Ravi Shankar e o pensador e escritor Deepak Chopra. 

Dirigido por  Paola de Fiori e Lisa Leeman, veteranas premiadas no Sundance Festival e indicadas ao Oscar por trabalhos anteriores, AWAKE é uma homenagem, mas também uma proposta de resgate dos ensinamentos do guru Yogananda que, entre outros, escreveu o livro " Autobiografia de um Yogue" (1946), clássico que inspirou milhares de seguidores em todo o mundo. 


Yogananda trouxe para o Ocidente os ensinamentos da meditação e da prática da Kriya Yoga. E nessa passagem de 15 anos pela América conheceu o preconceito racial, a intriga de antigos companheiros e a exaustão diante da tarefa que lhe foi incumbida pelo próprio mestre.

Com parcialidade e reverência, Paola e Lisa mostram o choque e o impacto da espiritualidade hindu na alma americana. E plantam, no espectador receptivo, a vontade de expandir fronteiras em busca de mais humanidade e paz para a alma. 

Boa pedida em tempos de radicalização e intolerância extremas.    

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

HIPÓCRATES


O filme é francês, o diretor é médico e o tema é sim muito familiar aos brasileiros que dependem do Sistema Unico de Sáude. Um filme quase todo rodado dentro de um hospital com personagens que provocam empatia ou antipatia, mas prendem a atenção do espectador.   

Com episódios da série House sempre na tela dos monitores de TV, Thomas Lilti construiu um filme que faz crítica social, é engraçado mas também pode fazer chorar. 

E sim, na França, aparelhos simples como um eletro, por exemplo,  também carecem de manutenção. Lá, o chefe controla e até manda retirar a morfina que alivia as dores horríveis de uma velhinha que só quer morrer em paz.

O administrador do hospital é um burocrata facilmente reconhecível e os protegidos, mesmo quando pisam feio na bola, também ficam impunes. Sobra, é claro, para o médico argelino, aquele que trabalha com dedicação e afinco, mas não consegue vencer as barreiras impostas desde sempre. Ganha menos, sofre um preconceito aparentamente "light" dos colegas e na prova dos nove vira bode espiatório.

Alguns personagens são especialmente cômicos, outros até poderiam ter recebido um melhor tratamento dos roteiristas. Mas no conjunto, HIPÓCRATES diz a que veio. Entretém, cria vínculos com a plateia e faz pensar no labirinto de dificuldades que é a saúde pública aqui, em terras tupiniquins ou lá, na pátria do velho Obelix.