sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

O sapateiro de Baghdad


Tenho um grupo de velhos amigos na internet. Há muitos anos compartilhamos notícias, opiniões, desagravos, alegrias e tristezas. Somos um grupo que aposta na cumplicidade. E agora que estamos quase todos cinquentões creio que a importância de nossa amizade é cada vez mais palpável. Temos um pacto implícito de envelhecer juntos com amor e muito carinho, mesmo que na maior parte do tempo a nossa comunicação seja virtual.
Nos próximos quinze dias serei uma "blogless". Viajo sem meu note book e pretendo atravessar montanhas e lagos sem pensar na Lan House mais próxima.
Apesar do lugar comum, quero deixar para os meus pouquíssimos leitores uma mensagem de final de ano: quanto maior a indignação diante da mediocridade, da truculência e da cobiça desmesurada, imensas serão as nossas chances de poder continuar a sonhar, seja lá qual for o seu sonho.
Contei logo acima sobre meu grupo de internet porque esta semana um grande amigo escreveu sobre a sapatada do jornalista iraquiano no agora quase moribundo Bush:

Muntadhar al-Zaidi. Não esqueçam este nome. Pode ser um péssimo jornalista, porque deixou a "objetividade" de lado, a "isenção", e "tomou partido" no assunto que cobria. Mas é um herói do povo iraquiano, e de todas as mentes livres do mundo. O sujeito que enfrentou e afrontou o carniceiro. Vida longa a Muntadhar al-Zaidi, com toda a glória que merece!!! Liberdade para ele JÁ !!!!!!!!!!!!!!!!!!!
PS - Está sendo torturado na cadeia do Iraque "democrático". E poderá ser processado por "tentativa de homicídio de líder estrangeiro", pena de até 15 anos. Tentativa de homicídio!!!!!!
PS-2 - São Negão ( apelido de Barack Obama) absolverá ou mandará para o inferno? Aberta a temporada de apostas.

É com o apelo pela libertação imediata do sapateiro de Bagdhad que me despeço temporariamente. Aos primeiros visitantes deste blog um abraço sincero e gratíssima pela força! Até o ano que vem.


quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

É o uó do borogodó


Então ficamos assim. Porque indignação e perplexidade já não têm vez no cenário tupiniquim. É trapaça em cima de trapaça. Sem tempo para digestão.

Militares e civis flagrados roubando os donativos enviados para os flagelados das chuvas de Santa Catarina? Você imaginava ter que dormir com essa neste final de ano? Pois então. E a pose dos soldados saindo com mochilas carregadas de donativos? O riso, o escárnio. Sem falar na cara de pau da tal Teresilda Longen, a fulana que só devolveu o produto do roubo depois que a sogra a chamou de ladra.

Pausa para a taquicardia e para a falta de ar. Haja putice.

Podia ser enredo de minissérie, mas acabou se transformando em caso de.....uops, polícia. É triste educar um filho num país como este.

Um país em que operações policiais vazam a favor do bandido, vide caso desta semana na Rocinha. Uma terra em que protestos contra milhares de mortes violentas, no Rio de Janeiro, reúne menos manifestantes do que uma roda de samba na Lapa. Uma nação dividida entre a vontade de crescer com dignidade e a compulsão pelo acúmulo, pelo consumo exagerado e pelo enriquecimento a qualquer preço.

O professor de Ética Roberto Romano disse, em entrevista ao GLOBO que " não é possível perder a referência da perversidade, daí a importância da educação e do estado de direito". O historiador Marco Antonio Villa alerta: " quando se vê um político dividindo sacos de dinheiro, começa-se a achar natural um soldado , um voluntário separar daquele conjunto o que é melhor para ele. É necessário dar um basta".


Eu quero ajudar a dar esse basta. Alguém pode me dizer o que devo fazer? Ainda não voto nulo, tento acertar nas eleições mas estou convencida de que o buraco é mais embaixo. Esse nosso chamado sistema democrático precisa urgente de algumas revisões. Como sustentar uma democracia que seja representativa - de fato - num país em que o abismo entre ricos e pobres é um dos maiores do mundo desde 1500?

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Madonna, a terceira idade e nosotros



Parece troca-troca. E é. Ocorre que minha primeira postagem, aquela com a qual dei o pontapé inicial neste blog, foi justamente sobre..............envelhescência:
Mulheres envelhecem como adolescentes ou os homens nos constrangem como velhos babões?
Ricardo Soares voltou ao tema quando comentou uma crítica contundente ao super fenômeno Madonna. Assim estava escrito no blog todoprosa:
Madonna é isso tudo ou nada disso ? um ícone pop, uma revolucionária comportamental, uma mega Leila Diniz ou apenas um produtaço rentável da indústria cultural ?
Cinquentona, Madonna provoca arrepios de amor e de ódio. Mas não creio que esteja envelhecendo como adolescente. A foto dela e dos filhos, na janela do hotel carioca, não esconde o escorrer inexorável do tempo. Em casa ela me parece ser mãe, sem maquiagem. No Maracanã é o produtaço rentável da indústria cultural.
Não sou fã da Madonna. Nos anos 80, estive mais para Prince, já que minha memória musical classificou esses dois ícones da música pop em alguma estante parecida. Se fossem livros estariam pertinho um do outro.
Não sou tiete mas admiro a sobrevivência da diva, apesar da mídia.
Sempre volto ao tema idade, né mesmo? Mas acredite: não é fácil envelhecer neste século 21 e num país como o Brasil. Ainda voltarei ao tema.
Aproveito para justificar: os homens nos constrangem sim, muitas e inúmeras vezes, como velhos babões. Referem-se às mulheres da mesma idade como velhas e babam pelas mulheres mais jovens. Mas são os primeiros a ridicularizar quando as fêmeas da mesma geração saem, namoram ou casam com machos alguns anos mais novos. Resquícios eternos do patriarcalismo? Entenda esse exemplo como exemplo mesmo. Não estou generalizando.
Mulheres envelhecem como adolescentes quando invadem e escavam o próprio corpo em busca da ninfetice eterna. É caso para Freud e para a minha querida Maria Rita Kehl, psicanalista e estudiosa que há muitos anos reflete e escreve sobre angústias cabeludas. Em tempos de sexualidade over e de comportamentos adultos que beiram a pedofilia, faz bem presenciar ou testemunhar relacionamentos em que o casal ainda é da mesma geração apesar da terceira, quarta ou quinta idades.
O filme MAMMA MIA, musical de sucesso recente, é um belo exemplo. No escurinho do cinema o que me chamou a atenção foi justamente a "normalidade" dos relacionamentos: jovens namoram jovens e coroas podem sim se apaixonar por coroas. Ver Pierce Brosnan batalhando pela Meryl Streep e não pela filha dela é algo raro nos dias de hoje.
E assim caminha a nossa humanidade. Infantilizada pela cultura de celebridades e afundada num culto ao sexo com prazer, a qualquer preço, que provoca muito mais dor que prazer. Mais Tânatos que Eros. Faz parte?






domingo, 14 de dezembro de 2008

Homens femininos pero siempre masculinos

Se você gosta sensualmente de rapazes sabe muito bem: existem os homens femininos que gostam de homens e os homens femininos que preferem, também sexualmente, as moçoilas. Tenho um grande amigo cinquentão - com corpinho de 30 - jornalista, prolixo, romântico e há um tempo afastado oficialmente da profissão. Marinheiro navegante, Gilson Ribeiro não abre mão das palavras. E desde a juventude fez correr solto esse seu lado mulher que deixava as garotas caidinhas por ele. Há poucos dias me enviou o texto abaixo. Compartilho. Há poucas coisas mais gratificantes do que sentir que minha geração cinquentona insiste na beleza da poesia e dos sonhos. É mais gostoso ser mulher depois de ler o meu amigo querido.


A arte de ser mulher

Eu sou menina. Eu sou mulher. Sou o sol e sou a lua, a loucura e a razão. Sou a verdade, sou a mentira. A decência e a intriga. Sou o delírio do ser masculino. A ciranda da criança. Sou o amor mais intenso, sou terrível na vingança. Eu, mulher e menina, sou o bicho, sou o lixo, sou o ouro, passaporte para qualquer mundo, sem precisar de um visto. Sou o teto, sou a cama, sou o telhado e a varanda. Sou o choro e a chance da esperança. Sou adulta, sou criança. Mulher e menina, afirmo como estabelecido: sou cachorra, beijo a boca de quem eu quero, acordo cedo, trabalho e cuido dos meus filhos. Sou fêmea, sou secreta. Sou uma caixa fechada de pernas abertas. Sou crua, sou dama, sou prostituta, sou o mundo e sou a rua. Na menstruação, fico nervosa Que ninguém comigo possa! Abraço um corpo suado, sonhando em ser perfumado. Assim, de repente, (que ironia!) eu me entrego de verdade, para um idiota qualquer, chamando de namorado. Sou menina. Sou mulher. Sou a faca e a colher. Sou vaidosa, exibicionista. Faço sexo, como artista. Tiro fotos e mostro o corpo. Mesmo assim já fui enganada até o pescoço. Por isso é melhor o Adão se calar. E a serpente também. Sou mulher no infinito, eterna Eva no paraíso. Eu sou mulher. Eu sou menina. A poesia que não será lida. Dos meus seios corre o leite e do meu ventre nasce a vida.

O esvaziamento da alma

Blogs têm a ver com palavras, com imagens, com conceitos, com intenções. Muitas vezes questiono a quantidade de palavras gastas para expressar sentimentos variados. Navegando pelos blogs, encontrei o da portuguesa Guida Mendes. Nele, uma citação que considero atualíssima. Belas palavras para definir a hemorragia e o abuso das palavras. Vou querer saber muito mais sobre Antonio Alçada Batista.

Não se pode viver sem pensar e não se pode pensar sem palavras. Mas as palavras, quando despojadas da vida são a hemorragia, o esvaziamento da alma. A hemorragia das palavras, está a perder a nossa civilização. Os homens e as sociedades estão a esvaziar-se. Vivemos uma existência anémica porque abusamos das palavras. Os discursos não param. Perdemos a nossa vida em discussões, e em confissões públicas, e em debates, em processos.Vai ver que vamos passar a história com a idade dos processos. Estamos a ser sangrados pelas palavras."
António Alçada Baptista, In Os nós e os laços (2001). Lisboa:Editorial Presença.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Livros imperdíveis


Como disse meu amigo Ricardo Soares, depois que começa vira vício. Fui visitar o Diário da Mulher Aranha, escrito por uma portuguesa que vive em Bruxelas, e pesquei uma dica de livro que já virou febre mundial. É o Os Homens que não amavam as mulheres (Companhia das Letras), da trilogia Millennium, do escritor e jornalista sueco Stieg Larsson, que morreu ao 50 anos, em 2004, antes mesmo de conhecer e usufruir o sucesso de seus livros. Fui clicando aqui e ali e dei de cara com o blog do Favre, husband de nossa ex-prefeita paulistana. Elogios mis. Cliquei ainda mais e fui parar em outro blog português, escrito por um Pedro Cavaco com carinha de criança. Sortudo, o Pedro já aguardava, para novembro passado, a chegada do segundo livro da trilogia, A Rapariga que Sonhava com uma Lata de Gasolina e um Fósforo. Em Portugal, o título do primeiro livro da série é bem diferente do nosso tupiniquim: Os Homens que odeiam as mulheres. Mais interessante, né não? Esta é a primeira vez que gosto de um livro por antecipação, sem ter aberto ainda a primeira página.


quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Quando o preconceito escapole

Sabe quando estamos no meio de uma conversa e de repente nos pegamos falando alguma coisa absolutamente preconceituosa? Algo na linha do " tem trabalho pra todo mundo, quem não consegue é preguiçoso"? Ou ainda: " puxa, que legal, seu filho é homossexual? Mas o que foi que houve com ele, foi infeliz em algum namoro com mulher"?
Em tempos sombrios e hipócritas de obrigações politicamente corretas considero fundamental olhar pra dentro de nós mesmos e tentar separar aquilo que de fato somos daquilo que estamos exibindo na passarela da vida. O deslize ao definir o companheiro ao lado como negro, em vez de afro-brasileiro, é mero detalhe perto da atitude cotidiana que nossa classe média adota para tratar ou se referir aos mais pobres e aos nossos empregados.
Em tempos do mais absoluto individualismo repetimos, todos os dias, a tradição da casa grande e senzala. E alisamos, com aparente comiseração,o abismo que nos separa de nossos subordinados, menos afortunados.
Em tempos de guerra no Rio de Janeiro abro bem os olhos e da minha janela avisto a favela morro acima, a menos de 300 metros de onde estou. Oculta por uma mata linda, a comunidade onde mora minha empregada vive dias de muita tensão. Ouço os relatos, me entupo de indignação. Mas não subo o morro pra ver de perto o abismo que nos separa.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Vertigem

Não repare. Desde a mais tenra juventude penso nos diversos significados da morte. Lembro que aos 15 anos, durante uma aula de artes plásticas na Aliança Francesa, tive a primeira Vertigem relacionada ao tema. O tema da aula era o grande Diderot e a professora projetava fotos de algumas obras do artista. Assim como quem não pede licença, a sensação começou a tomar conta de toda a minha pessoa, body and mind. Creio que o desespero estampado na obra do pintor francês detonou tudo o que veio a seguir: uma tentativa vã de imaginar o nada, o vazio absoluto, a não volta, tudo sem eterno retorno. Eu ainda nem tinha começado a pensar em Niezstche. O ar foi acabando, a sensação de poço sem fundo só fazia aumentar. E plaft, escuro e breu absolutos. O desespero dos atores de mestre Diderot já estava dentro de mim.
Lembro da professora tocando com delicadeza o meu ombro: ça va, Tania? E a resposta demorou a sair. Oui.... No rosto o suor gelado.
Desde então faço experiências com a sensação. Só que pra sobreviver à vertigem comecei a ler tudo sobre Morte: escritores, filósofos, religiosos...
A vertigem diminuiu, mas o embasbacamento com a razão de ser de tudo isso que nos cerca está sempre presente. Decididamente, nossa cultura ocidental não nos prepara para a morte. Somos incentivados a acreditar que ficaremos por aqui for ever. Here, there and everywhere.
Se você curte o tema - mesmo que não sinta a Vertigem- dê uma espiada e, quem sabe, uma boa lida no livro mais novo do Irvin Yalom, DE FRENTE PARA O SOL. É uma delícia e um conforto saber que a Vertigem mexe com muita gente, de ateus a budistas. Junto com o LIVRO TIBETANO DO VIVER E DO MORRER, DE FRENTE PARA O SOL transformou-se num grande companheiro de viagem.
Durmamos em paz.

Ainda o envelhecimento. E dá-lhe morte.

Ia deletar a primeira postagem porque não queria ser tão leviana com a envelhescência. Mas reli a frase e considerei que nas duas linhas que escrevi existe um fio tênue, porém contínuo, que dá sentido ao que penso sobre a difícil arte do envelhecer.
Na verdade, penso que vivemos uma época em que não está nada fácil ficar velho. Que os homens sempre trocaram suas gostosas de 50 ou 40 por uma ou duas de 20 ou 30..... ça va sans dire. Mas hoje em dia, o tal processo de envelhecimento está complicado. A velhice saudável tem um número imenso de regras e mandamentos mas, para as mulheres, cumprir todas as etapas exigidas pelo politicamente correto não significa necessariamente conseguir o efeito desejado. E, as always, quem acaba indo parar na terapia, comprando livros de auto-ajuda, recorrendo ao budismo ou à yoga.......... somos nós mesmas, las mujeres. Se você tem 50 anos ou mais, como eu, experimente sair com um outro coroa 10 anos - eu escrevi dez anos, o exemplo é light - mais jovem que você. Se morar no Rio de Janeiro leve o jovem senhor para o calçadão. Coloque seus óculos escuros em posição estratégica e repare nos olhares incessantes e/ou nos comentários em voz baixa. É uma loucura! Você sai da pista com vontade de renascer homem ou então de voltar a este planeta com intenções menos sexuais. Born to be wild!

envelhecer como adolescente

Mulheres envelhecem como adolescentes ou os homens nos constrangem como velhos babões?