sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

A VIDA CONTINUA INDO (por Cristina Montenegro)

O negócio é aguentar no gerúndio, essa santa bóia de salvação verbal, que nos mantém INDO, mesmo que a gente inevitavelmente SAIBA para ONDE; nele, passado e presente vibram com energia, coragem, motor; com a vida da Vida SENDO, e pronto.
O chato é o mundo dizendo a você que você morreu, a partir muitas vezes dos 40 anos, e que se não morreu, deveria ter a boa educação de morrer, para dar espaço para outros. No caso de você não se mancar e não morrer, tiram seus empregos, impedem muito sutilmente você de trabalhar e ganhar dinheiro para se sustentar e para se divertir (é claro), e mesmo se for o caso de você ter alguém que o sustente, ou uma aposentadoria daquelas espantosas (de empregos públicos especialmente), deixam BEM claro que você está empatando a vida dos outros que chegaram depois, e empatando a vida do Estado; do Mercado, não, pois esse sempre dá um jeitinho de tirar casquinha.
Foi por aí que enxerguei minha própria 'velhice' ,usando aqui o termo como o diagnóstico de uma doença.
Se não fosse tratada como doença, falaríamos tão somente da passagem do tempo...
Mas QUEREM decretar o 'diagnóstico'.
E começa o massacre: os convites para trabalho minguam, os encaminhamentos de clientes minguam, o desejo de formalizar novos estudos é francamente sabotado (a não ser que o seu QI na Academia seja de primeira).
Não permitir que te diagnostiquem é um ótimo combate... Um exercício, uma ginástica, na qual meu otimismo investe.
Ah, sim: o envelhecimento não roubou meu otimismo, e o Pensamento o realimenta.
Humor é gerúndico. A maioria dos que chegam e dizem 'que não aparento a idade' está na verdade afirmando o quanto se sente ofendido por isso, pelas poucas rugas e banhas que vê; meu humor gerúndico e combativo ri; prá dentro, para não tripudiar.
Otimistas comem bem (comida saudável e muitos livros), malham, conversam com a Natureza, acolhem os mais necessitados, dançam, paqueram, namoram... fazem enfim essas coisas que fazem bem para a pele.
Então nada muda?
Os dentes. Eles caem, não é?
E se não te deixam trabalhar para ganhar dinheiro, não há como repô-los...
Humor, ironia, batalha diária, boa alimentação, malhação, leitura, bem-querer não colocam dentes no lugar.
Mas... já passei por isso. Os de leite também cairam. Outros apareceram.
Well, não vão aparecer novos dentes para substituir esses que caem agora, mas OUTRAS COISAS aparecerão.
E a vida continuará INDO.
Gerúndio não tem ponto final, e minha curiosidade continua acesa prá chuchu; o suficiente para querer ver e experimentar como é que se vai até o tal ponto em que dizem que o gerúndio permite, e não tem data marcada.

PS.: Dentes que caem são pequenos féretros; mas não se diz que para o jogo ser o melhor possível é preciso treinar?...