segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

MAKING A MURDERER, UM DESAFIO PARA O BOM SENSO


Por esses dias um amigo querido, Ricardo Soares, usou a palavra "instigante" para definir um filme que o agradou e que ainda não vi, THE LOBSTER. Eu empregaria a mesma palavra em relação a MAKING A MURDERER, a impressionante série em dez episódios exibida pela Netflix. Uma porrada no estômago, um tapa na cara, um chute no traseiro, todas essas sensações acumulam-se durante as dez horas de exibição. 


MAKING A MURDERER coloca o espectador diante de um desafio: acompanhar uma história que teve um começo injusto, uma metade aparentemente resolvida e um fim ainda por ser construído, apesar do triste prognóstico atual. 

As diretoras Moira Demos e Laura Ricciardi botaram pra quebrar. Dedicaram dez anos de suas vidas ao caso de Steven Avery, um jovem injustamente preso, durante 18 anos, acusado de estupro, libertado e em seguida novamente preso e condenado a prisão perpétua por homicídio. Um trabalho impressionante de registros, entrevistas, filmagens, áudios gravados e uma edição final que mostra que a "montagem" da realidade pode servir a várias interpretações - para o bem e para o mal. 

Poucos roteiristas imaginariam uma história tão intrincada e complexa como a que se revira nervosamente diante dos nossos olhos. Faz o Sistema, sim, os tais sistemas judiciário e policial parecerem uma quadrilha de malfeitores empenhados em não permitir que o bem aflore, sob nenhuma hipótese.


Acompanhar as versões da história de Steven Avery me lembrou a disputa de opiniões que se desenrola nas redes públicas. A maioria não quer ouvir o que o outro poderia ter a dizer ou mostrar. O objetivo parece ser apenas o de marcar um território invisível em que os dois lados atiram pedras e palavras.

Muito mais pesado, MAKING A MURDERER traz um sistema cruel que busca a condenação, raramente a absolvição. Um universo jurídico que alimenta a vingança e manipula o conservadorismo moral e emocional dos habitantes de uma cidadezinha no interior do Wisconsin, nos Estados Unidos.  


Como brasileira que desconfia do comportamento da nossa polícia, um fato me chamou a atenção na série: nas pequenas cidades norte-americanas, acusar policiais de corrupção - distorcer a cena de um crime, plantar provas, etc -  pode provocar indignação e revolta na população que ainda acredita que os chamados defensores da lei são os "mocinhos" da história. O lado podre tem essa consciência e trabalha para ativar, nas pessoas, essa sensação de ultraje. Incrível como entre nós a rotina da maracutaia policial não impacta e nem impressiona.

MAKING A MURDERER é o século 21 mostrando que a cegueira moral é tão destrutiva quanto uma arma letal apontada para as nossas cabeças.