quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Esperança e pessimismo


Quem é você, meu precioso leitor, neste janeiro de 2009 em que Barack Obama toma posse e parece querer chacoalhar a poeira do conservadorismo norteamericano?
Um herdeiro do existencialismo de Sartre? Um apaixonado pelos livros de autoajuda? Um cidadão que respeita os princípios da democracia ocidental? Um indignado com a lenta agonia dos povos africanos? Um seguidor disciplinado das teorias econômicas pós-marxistas? Ou um cético que cumpre estoicamente sua estadia no planeta e não derrama uma lágrima em nome de utopias passadas ou passageiras?

É assim que me encontro, meio lá, meio cá, nesta quinta-feira pós "inaguration" da era Obama. Uma mistura de pisca alerta com sinal verde, vai entender!
Tenho um grupo virtual de antigos amigos do peito. Escrevemos sobre tudo e sobre todos. Entre esses queridos cúmplices, alguns consideram o novo presidente norteamericano um enrolador de primeira. Palavras ao vento e nada mais.
Outro amigo, igualmente querido, jornalista inglês e dono de um humor negro tipicamente britânico, analisou uma parte da equipe de Obama para responder, de alguma forma, ao pessimismo e à falta de esperança de nosso companheiro. Eu ainda não tinha prestado atenção à turma do Meio-Ambiente. Empresto a listinha. Confira:

- Secretário de Energia - Steven Chu, prêmio Nobel, especialista em energia solar.
- Chefe da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (não creio que esse seja a tradução correta para o português, mas trata-se do órgão que decide sobre as posições americanas sobre o aquecimento global) - Jane Lubchenko, " fera" em biologia marinha, poluição de oceanos e pesca predatória.
- Consultor Científico - John Holdren, Harvard, perito em energia, meio-ambiente e proliferação nuclear. Ex- presidente da Associação Americana para o Avanço da Ciência que afirma, há muito tempo, que os EUA têm que fazer muito mais na área de aquecimento global.
"Comparado com o obscurantismo medieval do governo Bush", conclui meu british friend, "será que isso não nos autoriza a pensar (com seriedade) que a política americana na área de aquecimento global vai mudar radicalmente? Você pode continuar como cínico, mas teu filho certamente vai agradecer a mudança. Se não for tarde demais..."
Não quero que seja tarde demais. Sei que os discursos de Obama são escritos por um jovem super talento de 27 anos. Mas também sei que Barack não pode e não vai governar apenas com discursos sedutores.
Suspender julgamentos em Guantánamo e fechar as prisões secretas da CIA........... já é um baita começo, fala a verdade. E como se não bastasse o homem, além do charme pessoal, sabe administrar as palavras e o tom de emissão de cada uma delas. Por enquanto, creio, não são apenas palavras ao vento. E acariciam, como veludo, nossos corações machucados pela brutalidade do dia-a-dia.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

A impunidade não para de renascer


Então é assim que ficamos, não é mesmo? O teto de amianto desaba e nove mulheres morrem. Casas vizinhas foram destruídas e interditadas depois do desabamento e moradores da região afirmam que o teto está com problemas há muito tempo.

Segundo reportagem da Folha de São Paulo, o Ministério Público do Estado de São Paulo irá apurar se houve negligência na liberação do edifício da igreja Renascer no bairro do Cambuci, em São Paulo. Essa mesma construção já tinha sido INTERDITADA em 1998 porque o teto e o forro já apresentavam problemas e ofereciam riscos aos frequentadores.
Tive que ler duas vezes: 1998, 1998. Portanto, quase 11 anos atrás.
Há dois anos, o lobby de vereadores ligados às igrejas evangélicas, na Câmara Municipal, conseguiu impedir uma investigação das instalações de locais onde são realizados eventos com grande concentração de pessoas na cidade. Os templos ficaram fora da apuração da CPI do Licenciamento.

Agora, em nome de Jesus, quem vai pagar essa conta? O casal fundador da igreja Renascer, preso nos Estados Unidos - mas transmitindo mensagens via satélite - por estelionato, lavagem de dinheiro e outras cositas más? Ou a turma que enriquece diuturnamente aqui mesmo, em terras tupiniquins?
E alguém já leu algum comunicado oficial do jogador Kaká? Ligou depois do desabamento para saber dos parentes e sua assessoria anunciou que ele faria um pronunciamento oficial sobre o acidente. Ainda não li nada e estou curiosa. Afinal, ele é o grande garoto- propaganda da igreja no Brasil e no mundo.
Até quando os responsáveis pela tragédia - totalmente anunciada, diga-se de passagem, desde 1998 - continuarão a falar em nome de Jesus sem ao menos lavar a boca com sabão antes de iniciar a verborréia?

domingo, 18 de janeiro de 2009

Emoção, má-fé ou realidade?


Eu sei que o Holocausto " foi um genocídio em massa com base em preceitos expressos de superiodade racial, deportando de seus países e assassinando industrialmente, sem conflito, milhões de pessoas em campos de extermínio, com objetivo declarado de varrê-las da face da Terra". Assim escreveu Arnaldo Bloch em sua coluna deste sábado, no Globo. Da mesma forma entendo a indignação de Cora Rónai, que escreveu na semana passada sobre o tema. Sou leitora assídua das colunas assinadas pelos dois no jornal carioca.
Também não confundo palestino com muçulmano e nem judeu com israelense. Mas não posso evitar a associação livre, sem nenhuma má fé. E por que? Porque leio a história recente dos conflitos na Faixa de Gaza. Pedir que controlemos todas as nossas emoções no sentido de não ferir a História, com h maíusculo, é exigir demais do bom senso de qualquer pessoa.

Não apóio o Hamas, mas simpatizo com a causa palestina. Considero insanamente cruel o cotidiano imposto pela política de Israel (e de seus aliados) aos habitantes da Faixa de Gaza. E entendo que a reação aos bombardeios do Hamas é absolutamente desproporcional aos danos causados por esses mísseis. Deploro o bloqueio econômico que persiste naquela área, com o apoio irrestrito dos Estados Unidos, apesar de acordos em contrário.
Há alguns dias reproduzi um trecho de artigo do jornalista inglês John Mc Carthy sobre o massacre de Gaza. Ele afirmava que nosso imaginário coletivo carrega a culpa pelo Holocausto. E que por isso criticamos as posições de Israel, mas não temos coragem de ir muito além disso, talvez por medo de sermos acusados de atacar um povo que já sofreu tanto.... Para Mc Carthy, a tragédia é que, agora, um outro povo está sofrendo por causa da hesitação do mundo em ofender Israel.
Li e reli a opinião do jornalista britânico. Deixei guardada, numa gavetinha do meu cérebro. Doc holocausto.
E pergunto, com todo o respeito aos milhões de vítimas e aos sobreviventes do massacre nazista: é tão estranho que todos os horrores dessa guerra absurda e interminável façam renascer, na imaginação de milhões de seres humanos, o inimaginável e irreproduzível terror dos tempos do Holocausto?
E mesmo que muita gente saiba diferenciar israelense de judeu, não é compreensível que se misture ideologia com religião? Afinal, o estado de Israel não nasceu justamente em 1948, com o mundo ainda em estado de choque em função do extermínio de milhões de judeus?
Aprendemos muito pouco, de lá para cá.

O que dirá Obama? Acho salutar que o já super presidente inicie seu mandato com a obrigação de abrir o jogo sobre a Guerra de Gaza. Muita gente ficará decepcionada, eu também. Mas faz parte.
A foto que ilustra este post mostra jovens oficiais nazistas brincando com as tigelas vazias em Auschwitz. Depois de ler essa informação não é incrível como a nossa percepção da imagem muda completamente?
Yes, we can, but just a little bit!

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Hitchock e os pássaros do avião

Houve uma época em que Hitchcock assustou o escurinho do cinema com seus pássaros assassinos. O filme é tão bom que blogueiros de 15 anos dedicam linhas e mais linhas ao tema. Acho sensacional.
Mas e os pássaros de todos os dias, esses que entram na turbina dos aviões e provocam grandes e pequenos desastres?
Ontem, depois de várias horas longe do computador, voltei pra casa e liguei a TV. Não acreditei nas imagens do avião afundando no rio Hudson, em Nova York. Alguns segundos de perplexidade para entender que todos os passageiros tinham sido resgatados e sobrevivido. Que sensação boa! Tentei imaginar o que passou pela cabeça e pelo coração de toda aquela gente nos segundos que antecederam a aterrissagem na água. O medo e depois o alívio. A volta ao planeta de todos os dias. A felicidade de estar simplesmente vivo mas radicalmente modificado. Passar raspando pela morte e sobreviver ao imponderável.

Em épocas de massacres em Gaza faz bem saber que o talento e a experiência de um piloto e sua equipe venceram os pobres pássaros de Nova York. Que filme faria, com um belo argumento desses, o nosso mestre do terror?
Viva a vida e quem ajuda a viver.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

A empáfia de alguns guardas municipais



O rapaz, morador de rua, dorme no calçadão da Praça do Lido, em pleno verão carioca. Três guardas municipais acordam o rapaz, dois o seguram e o outro lhe pespega tapas na cara e pontapés no corpo. Declaram a prisão do infeliz.
Mas...........antes que tudo seja concluído como sempre é - nós, pedestres, olhamos com indignação mas não podemos estapear esses mesmos guardas - um outro rapaz, provavelmente um advogado vestindo inacreditáveis terno e gravata às 3 horas da tarde, começa a discutir com o chefe dos guardas. Morador do Lido, diz que o sem teto não pode ser tratado a bofetões e nem ser preso da forma que foi. Que a agressão é gratuita, irregular e sem sentido. O guarda discorda, eles falam alto e uma pequena multidão assiste ao suposto confronto. Ali, na calçada da avenida Atlântica, a indignação é geral. Muita gente tinha presenciado a agressão dos guardas. O mendigo coloca a cabeça pra fora do carro e tenta explicar, mais uma vez, que foi agredido assim, de repente, sem mais nem menos. Covardes, alguém grita. O clima é tenso e os policiais, cacetete na mão, olham para nós com cara feia.
O jovem de terno e gravata quer saber para onde o mendigo será levado. Um outro guarda, recém desembarcado de uma outra kombi lotada de guardas municipais, responde que isso não interessa a ninguém. O suposto advogado se irrita e fala mais alto ainda que todos têm o direito de saber para onde o preso será levado. Mais tensão, mais discussão, dedos em riste. E o guarda municipal declara a prisão do moço de terno e gravata. Ele é empurrado para dentro de uma outra kombi, enquanto a platéia vaia e atira frases exigindo explicações. Todo mundo conversa com todo mundo, mas o guarda-chefe cisma com o papo de um outro engravatado, que diz algo como "esses caras são recalcados porque não passaram no teste pra PM". Humor on the road.

Pasma com a empáfia desses servidores municipais me pergunto até quando a pobreza de espírito reinará entre os fracos e oprimidos. Será que alguém pode organizar um curso de " Humanidades" pra que essa turma aprenda como tratar as pessoas? Ou nem isso vai adiantar, já que bons modos não está escrito no glossário utilizado por eles?
Antes de escrever fui tentar saber se a Guarda Municipal tem poder de polícia. Li e reli, mas confesso que não entendi. Parece que podem prender alguém em flagrante, como qualquer cidadão também pode. Para onde levaram o rapaz de terno e gravata? Torço para que ele seja um advogado, um promotor de justiça. E que enquadre a arrogância e a violência dos guardas municipais. Mas se ele for simplesmente um cidadão indignado, já conta com a minha admiração porque resolveu mudar o seu trajeto de todos os dias para protestar contra o abuso do poder. E acabou sendo preso.
É como observou um outro rapaz: " esse morador de rua até pode ser um assaltante, mas ninguém tem o direito de abordá-lo a tapas e pontapés enquanto ele está dormindo" . A guarda municipal não reagiu, não preveniu. A guarda municipal agrediu o cidadão mais vulnerável da cruel escala social em que vivemos. Já imaginou esse pessoal armado?

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Globo de Ouro




Não assisti à transmissão do Globo de Ouro. Mas gostaria de ter visto Mickey Rourke receber o prêmio de melhor ator, homenagear seus cães e agradece-los pela companhia e "amizade". Não vi "The Wrestler" mas o treiler me impressiona. Que mistérios e labirintos separam o Mickey galã de " O Selvagem da Motocicleta" ou " 9 e 1/2 Semanas de Amor" do Rourke de rosto amassado e costurado em filmes como "Sin City" e esse último, que já lhe rendeu um Urso de Prata em Berlim? Quantas carreiras, quantas doses, quantos socos, quantos sonhos? Como alguém destrói um rosto que exalava sensualidade e o transforma num esconderijo de dor e autodestruição?
Não conheço as respostas. Mas consigo imaginar o que a fama e o dinheiro podem fazer com os corações e mentes mais vulneráveis.E cada vez que me deparo com a imagem atual de Mickey Rourke fico tentando descobrir uma expressão, um gesto, um traço........da harmonia anterior ao desastre. Em vão. Não procuro nesses esgares o jovem galã. Busco algo da forma original. Sempre em vão.
Gostei da premiação e da volta por cima - um processo reiniciado já há algum tempo - do ator que fez suspirar toda uma geração de jovens e coroas. Homens e mulheres. Mas, interessante mesmo foi o cara dizer, no microfone, que " às vezes, quando um homem está sozinho, tudo que lhe sobra é seu cachorro". Pra quem já foi conhecido e criticado pela empáfia típica das celebridades, Mickey deu um baita passo a frente ao agradecer, em público, a divina paciência dos cães. Não deve ter sido fácil.

Outra premiação interessante foi a de melhor ator em série dramática para Gabriel Byrne. A série " Em terapia", da HBO, trouxe Byrne em grande forma. Mostrou também grandes performances de atores que vemos por aí, sem prestar muita atenção. E fez vingar no horário nobre da tv paga diálogos primorosos. Parabéns ao original israelense. E que venha rapidamente mais uma temporada.

domingo, 11 de janeiro de 2009

No, we can´t !


Aproxima-se a posse de Obama. Fuzuê total em Washington. A turma do "Yes, we can" prepara-se para assumir o poder. Nós, aqui dos trópicos, podemos aproveitar esse período de suposta euforia para refletir sobre o " No, we can´t".
Em 2009 não podemos tolerar a hipocrisia, a indiferença e a corrupção. No governo e na população. Em nós mesmos. Vamos aproveitar um ano sem eleições para pensar muito. Assim como quem não quer nada... não custa prestar atenção no que podemos fazer para começar a eliminar essas três palavrinhas diabólicas do nosso dia-a-dia.

Hoje, domingão, numa caminhada aqui pela praia fui testemunha de um lindo espetáculo ao ar livre. Um senhor de mais de 80 anos se apresentava, como faz toda a semana, ali na Pedra do Leme. Sapateou como Fred Astaire, dançou como Michael Jackson e fez soar suas castanholas com esquetes de muita criatividade e humor. A platéia, que no início fingia indiferença e soltava algumas risadinhas de desdém, foi seduzida lentamente pelo artista. Quando passou o boné para as contribuições o clima era outro. Com talento e humor o velhinho arrancou elogios, abraços, aplausos e uma grana acima da média para aparições circenses do gênero. Mas o melhor de tudo foi ver derreter-se em alguns rostos, ainda que por pouco tempo, a máscara da indiferença e da hipocrisia. Venceu o afeto durante alguns minutos deste 11 de janeiro de 2009. Yes, we can!