domingo, 26 de dezembro de 2010

Até 2009

Em 2011 o tema envelhecer continuará firme por aqui.
Agradeço aos amigos que enviaram os textos que foram publicados
aqui.
Foi ótimo retomar o blog. Vamos ver o que o ano novo nos reserva.
Um beijo estalado para todos.

sábado, 18 de dezembro de 2010

VIVER MUITO É CONTABILIZAR PERDAS? (por Cecilia Thompson)

De fato, o ruído do tempo é enorme.Tenho agora indesejados 74 anos (não me venham com melhor idade que eu mato!). Acho que somente agora entendo o quadro geral, ainda assim mais ou menos. Como escreveu Vittorio Gassman, "a experiência é um farol de milha - pena que esteja voltado para trás". Pois é.

Aos 74 e quase meio, também detesto e rejeito! melhor idade é qualquer uma, desde que a gente esteja bem; eu, de moça, não entendia essa insistência dos mais velhos na tal da 'saúde', mas hoje me felicito por estar bem - embora tenha medos, claro, porque Alzheimer na família da mamãe é uma constante, e meu psiquiatra (...atra mesmo, pois há 12 anos fui atingida, como por um tsunami, por uma depressão quase fatal, hoje controlada com remédio - permanentemente sob vigilância, na jaula de onde me rosna) me avisou que tenho 52% de possibilidades, etc etc etc. enfim: quem viver verá. E ,se eu não perceber, pior para os filhos (que é o que mais me apavora, não quero dar trabalho a ninguém).
Outra coisa: se me mandarem prum bailinho da tal da terceira idade (acho que já estou na quinta!) ou jogar dominó na pracinha, eu também MATO!

Um casamento daquele tempo que durou. Mas há outros (nenhum meu, claro). Namorei um pouco bastante, tive um grande amor (Hamlet - esse o nome - jornalista, mora hoje nos Estados Unidos) no começo dos anos 80, viajei muito, 'casei' de novo em 90 com um rapaz 25 anos mais moço do que eu. C. era lindo, além de tudo um grande amigo, soropositivo, e cuidei dele (e nos divertimos!) durante cinco anos, até que ele morreu, aos 30. Eu estava com 55, e me fechei para o mundo. Cinco anos depois, quando consegui 'me abrir' e olhar de novo para os homens, aos 60 anos, ninguém mais me olhava, claro, e assim vou vivendo até os 74 e meio, que se completarão no dia 29 de dezembro. Depois 75, em junho de 2011... e quando me perguntam qual é a primeira coisa que vejo à frente, quando penso no futuro, me divirto dizendo que é o crematório da Vila Alpina - que tenho frequentado muito mais do que gostaria. Será que viver muito é contabilizar perdas?

Trabalhei 34 anos no Estadão - comecei tradutora e acabei ouvidora - de onde fui o último dinossauro demitido, em outubro de 2008. Não consigo pensar em parar de trabalhar - e sei que vc me entende.
Fiz amigos, mais jovens, dou aula no Curso de Focas do Estadão, perdi muitos amigos mais velhos, da minha idade ou mais jovens também.

Falando em idade: um amigo antigo e querido diz que só conhece duas, vivo e morto. Serve.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

O OUTONO DE NOSSAS VIDAS (por Rosana Tonetti)

“Serra, serra, serrador, serra o papo do vovô.” Quando garotinha, embalada por esta cantiga popular, eu subia nas pernas da minha bisavó que, empinando-as, imitava o sacolejar de um cavalinho. Enquanto eu gargalhava e pedia intermináveis bis, ela, por sua vez, cansada, fazia várias pausas antes de recomeçar. E foi assim, da convivência quase diária com a minha bisa, que fui compreendendo que na mesma proporção que eu desabrochava para a vida, a avó da minha mãe murchava com o pesar dos anos. Aos poucos fui me dando conta de que a velhice era só uma fase anterior de uma passagem só de ida para algum lugar que eu não poderia ir. Pelo menos naquele momento. E como eu ficaria sem a companhia, o carinho e os cuidados daquela mulher que eu amava tanto quanto a minha própria mãe?
E foi deste modo que comecei a temer a morte. Não a minha, mas a das pessoas que me eram caras. Na minha inocência de menina, devotava minhas orações a Deus para pedir que não levasse a minha bisa antes do dia em que eu pudesse aceitar sua partida: “Por favor, Senhor, só quando eu for gente grande”, pedia, com aquela fé que nunca, nem mesmo quando adulta, voltei a experimentar. Ele ouviu minhas preces. Ela nos deixou aos 93 anos quando eu já tinha alcançado os 21.
Quase três décadas depois, continuo a não me preocupar com a morte. Quero dizer, com a minha propriamente. Ela só me abala quando rouba algum ente querido, como o fez com a minha bisa, meu pai, avós e alguns amigos ainda tenra idade. Minhas desavenças com esta lei implacável da natureza é com aquela fase que ocorre logo depois da maturidade. Meu sentimento é que a velhice é o ápice da traição de Deus com a humanidade. Morrer, tudo bem. Afinal, é preciso desbastar o mundo, renovar. Mas envelhecer, ah, isto não. Este é um processo contínuo que só se interrompe quando se coloca o ponto final na existência.
Tenho uma amiga que, ao completar 50 anos, comentou que estava apenas na metade da vida e que já planeja o próximo meio século. Eu hein! Tô fora. Acho que está se inspirando na avó, que chegou aos 102. E não é que a velhinha adora comemorar, exultante e feliz, a cada aniversário! Mesmo na cadeira de rodas, com muita dificuldade para enxergar e quase completamente surda. Sinto muito! Respeito e admiro quem pensa assim, mas não compartilho desta mesma sagacidade pelo viver. A menos que antes de me tornar um maracujá de gaveta a ciência já tenha conseguido vencer este avanço inexorável da decrepitude do corpo humano.
Estou sendo cruel e pessimista? Pode ser. Mas também devo admitir que nem tudo é tão ruim que não tenha o seu lado bom. Quando chegamos ao outono de nossas vidas levamos algumas vantagens! Bem, alguma a gente tinha que angariar, não é mesmo? A consciência de que o relógio cronológico que marca as nossas vidas, em que um dia a mais é na verdade um dia a menos, faz com que gastemos com mais qualidade o nosso tempo.
O acúmulo de experiências nos torna mais sábios, com o intelecto antenado, aguçado. Passamos por cima do supérfluo, das firulas. Pelo menos no meu caso sinto que hoje estou mais paciente e tolerante. Aprendi a segurar o pavio curto. Seleciono melhor as amizades, os relacionamentos afetivos, o lazer, os programas de fim de semana. Além disso, cada vez menos me preocupo com as críticas. Até a minha própria companhia, que eu sempre curti, ganhou mais intimidade.
Se há algo democrático e que não goza de nenhum privilégio entre as classes sociais é o duo formado pela velhice e a morte. Quem não encarar a segunda ainda jovem, terá que ajustar as contas com a primeira lá na frente. E quanto à segunda, infelizmente, não há margem para oferendas ou mesa de negociação.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

TAPETE CÓSMICO (Helio Pellegrino)

“Quanto você faz 20 anos está de manhã olhando o sol do meio dia. Aos 60 são seis e meia da tarde e você olha a boca da noite. Mas a noite também tem seus direitos. Esses 60 anos valeram a pena. Investi na amizade, no capital erótico, e não me arrependo. A salvação está em você se dar, se aplicar aos outros. A única coisa não perdoável é não fazer. É preciso vencer esse encaramujamento narcísico, essa tendência à uteração, ao suicídio. Ser curioso. Você só se conhece conhecendo o mundo. Somos um fio nesse imenso tapete cósmico. Mas haja saco!"

Hélio Pellegrino - Carta a Fernando Sabino, quando o autor fez 60 anos

(meu amigo Beto Borges enviou esse trecho de carta do Pellegrino para um outro amigo, Gustavo Barbosa, que fez 60 anos no domingo, dia 5)

domingo, 5 de dezembro de 2010

ESTOU VELHO (Francis Ford Coppola) E OUTRAS REFLEXÕES

" Estou velho e sei que a melhor coisa da vida é a possibilidade de aprender coisas novas. Você pode beber demais e cair doente, pode correr o mundo atrás de mulheres e deixar sua família chateada. Nada disso, acredite, é importante. O que vai lhe trazer alguma coisa de verdade é o aprendizado".

E olha só que frase mais feliz: " Escrever um roteiro é como fazer uma pergunta. Filmar é ter a esperança de conseguir uma resposta".

Um grande amigo, que acaba de perder a companheira de muitos anos - uma de minhas melhores amigas - me escreveu pra contar que sempre lembra de uma entrevista do grande economista e intelectual Roberto Campos. Octogenário, declarou que "a velhice é um lento naufrágio".
O fascinante é ver, ouvir e ler análises e reflexões pessoais tão distintas umas das outras. Enquanto sigo nesta minha trilha aventureira o que mais me atrai é o poder aprender coisas novas. Sempre.
Será que estarei por aqui aos 80 como uma doce e paciente náufraga, passageira de um Titanic slow motion que será condescendente e acolhedor quando finalmente aterrissarmos na areia final?

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

A VIDA CONTINUA INDO (por Cristina Montenegro)

O negócio é aguentar no gerúndio, essa santa bóia de salvação verbal, que nos mantém INDO, mesmo que a gente inevitavelmente SAIBA para ONDE; nele, passado e presente vibram com energia, coragem, motor; com a vida da Vida SENDO, e pronto.
O chato é o mundo dizendo a você que você morreu, a partir muitas vezes dos 40 anos, e que se não morreu, deveria ter a boa educação de morrer, para dar espaço para outros. No caso de você não se mancar e não morrer, tiram seus empregos, impedem muito sutilmente você de trabalhar e ganhar dinheiro para se sustentar e para se divertir (é claro), e mesmo se for o caso de você ter alguém que o sustente, ou uma aposentadoria daquelas espantosas (de empregos públicos especialmente), deixam BEM claro que você está empatando a vida dos outros que chegaram depois, e empatando a vida do Estado; do Mercado, não, pois esse sempre dá um jeitinho de tirar casquinha.
Foi por aí que enxerguei minha própria 'velhice' ,usando aqui o termo como o diagnóstico de uma doença.
Se não fosse tratada como doença, falaríamos tão somente da passagem do tempo...
Mas QUEREM decretar o 'diagnóstico'.
E começa o massacre: os convites para trabalho minguam, os encaminhamentos de clientes minguam, o desejo de formalizar novos estudos é francamente sabotado (a não ser que o seu QI na Academia seja de primeira).
Não permitir que te diagnostiquem é um ótimo combate... Um exercício, uma ginástica, na qual meu otimismo investe.
Ah, sim: o envelhecimento não roubou meu otimismo, e o Pensamento o realimenta.
Humor é gerúndico. A maioria dos que chegam e dizem 'que não aparento a idade' está na verdade afirmando o quanto se sente ofendido por isso, pelas poucas rugas e banhas que vê; meu humor gerúndico e combativo ri; prá dentro, para não tripudiar.
Otimistas comem bem (comida saudável e muitos livros), malham, conversam com a Natureza, acolhem os mais necessitados, dançam, paqueram, namoram... fazem enfim essas coisas que fazem bem para a pele.
Então nada muda?
Os dentes. Eles caem, não é?
E se não te deixam trabalhar para ganhar dinheiro, não há como repô-los...
Humor, ironia, batalha diária, boa alimentação, malhação, leitura, bem-querer não colocam dentes no lugar.
Mas... já passei por isso. Os de leite também cairam. Outros apareceram.
Well, não vão aparecer novos dentes para substituir esses que caem agora, mas OUTRAS COISAS aparecerão.
E a vida continuará INDO.
Gerúndio não tem ponto final, e minha curiosidade continua acesa prá chuchu; o suficiente para querer ver e experimentar como é que se vai até o tal ponto em que dizem que o gerúndio permite, e não tem data marcada.

PS.: Dentes que caem são pequenos féretros; mas não se diz que para o jogo ser o melhor possível é preciso treinar?...

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

ENSINAMENTOS DE SÊNECA (Por Gonçalo M. Tavares)

Ontem,no Globo, o surpreendente escritor português Gonçalo M. Tavares, que aos 40 anos já publicou 29 livros, deu uma bela entrevista e abordou a questão da morte e do tempo. Compartilho.

Sêneca ensina que temos que agir sabendo que vamos morrer. Quando se está consciente da morte, distingue-se o essencial do acessório. A consciência da morte muda o modo como utilizamos o tempo. Muda a forma como vivemos. " Cartas a Lucílio" são cartas de Sêneca a um aprendiz. A primeira carta fala precisamente do tempo. O aprendiz reclama da falta de tempo. Sêneca diz a ele: " ao invés de se queixar da falta de tempo,vais ver o que é essencial e o que é acessório. E no dia seguinte fazes somente o que é essencial. E assim verás: tens tempo".